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sexta-feira, dezembro 18, 2009

Sucesso da conferência de Copenhagen

A essa altura do campeonato, todos dizem que a conferência do clima de Copenhagem foi um fracasso. Errado. Foi um sucesso completo. Os "analistas" estão apenas olhando para o alvo errado. O objetivo da conferência não era estabelecer metas de emissão de gás, controle do clima etc. O objetivo desta conferência, como todas as conferências estabelecidas para discutir objetivos altruístas, é apenas servir de palanque de proselitismo e de exibição pública de bons sentimentos. De preferência, culpando os outros. É o que todos os participantes de alguma importância parecem ter feito, com exceção de Barack Obama, que parece ter sido o último a realmente acreditar que a conferência do clima era para discutir o clima.

quinta-feira, outubro 15, 2009

Longo fluxo de pensamentos ouvindo um amigo chato falando de sua nova conquista amorosa

"Ele é chato. Deus, como é chato. Mas come muita mulher. Por que é chato. Será que eu sou invejoso por isso? Isso me torna também chato? Para comermos muita mulher temos de ser irremediavelmente chatos e falastrões, vide 'Queda que as mulheres têm pelos tolos', de Machado de Assis? É mais nobre manter uma postura digna e contida suportando os "nãos" e "você é só meu amiguinho" com que nos alvejam as bucetas enfurecidas, ou, lutando contra um mar de rejeições, tomar de uma máscara de mentiras, arrogância e estupidez manipulável, e, por oposição, comê-las? Eu não devia estar copiando Shakespeare. Devia estar variando minhas leituras para copiar outras citações. Aliás, será que alguém entende quando eu faço citações de Shakespeare? Ou só funcionava com o cara de 'C.S.I'? Por que ele saiu da série, por falar nisso? E entrou no lugar dele o negão que fez 'Otelo' no cinema. Isso quer dizer algo? Meu Deus, ele não para de falar. Será que era assim que ele conquista as mulheres? Se joga para elas com um zumbido enlouquecedor até paralisá-las e bombardeá-las, como os bombardeiros Stukas faziam com a cavalaria polonesa em 1939? Eu não devia estar pensando nisso. Afinal de contas, estou aqui ao lado da minha amada namorada... que neste momento está conversando animadametne com o resto da mesa, de pilequinho, pouco se importando para o fato de que eu estou aos poucos adquirindo uma doença respiratória de tanto prender o ar para conseguir me manter tentando ouvir essa história chata, sem contar com as rugas e sulcos que minha cara está produzindo apenas pelo gesto inútil de ser educado com alguém tão chato que o resto da mesa ignora. Todos já estão falando de outra coisa e me deixaram aqui montando guarda. ALÔÔÔ??? ALGUÉM AQUI ESTÁ ME VENDO? ALGUÉM PERCEBE O MEU SACRIFÍCIO INDIVIDUAL PELO GRUPOOOO? Alguém percebe que enquanto dou cobertura a esse bombardeio de chatice, todos se refastelam em conversas mais animadas? LU, se existe uma hora de dar uma prova de amor, é esta, se mais tarde você não resistir ao charme do porteiro quando eu estiver viajando, eu perdoo. Mas ME TIRE DAQUI, por favor. PERCEBA como eu estou sofrendo. Taí: em quantas e quantas mesas, por pura educação, eu acabei suportando os chatos enquanto o resto das pessoas se divertia às minhas costas? Esse esforço foi recompensado mais tarde? Ou, enquanto eu tentava segurar as pontas da solteirona cachaceira, a gostosa vistosa do outro lado da mesa olhou para mim? Claro que não. Ela ficou com o chato. Que não parava de falar no ouvido dela, pouco notando o meu drama, é claro. Bando de ingratos"

quarta-feira, setembro 23, 2009

Um breve encontro

"Sabe o que realmente me impressionou na 'cena' londrina? A quantidade de homossexuais que havia lá", cortou um desdenhoso Irving Kristol a Christopher Hitchens, no jantar em que eles se encontraram em Nova York, nos anos 70, quando o segundo perguntou ao primeiro do que ele se lembrava do tempo em que passou na capital britânica editando a "Encounter", uma revista qualificada que era financiada pela CIA. Mais impressões de Hitchens sobre o primeiro neoconservador estão na Slate. Um breve mas bastante revelador retrato das influências contraditórias que fizeram a cabeça deste ex-trotskista, clique no título do post.

quinta-feira, julho 02, 2009

Nunca se disse tanto por tão pouco

Como todo dia tem notícia nova sobre o assunto, é claro que parte dos meus pensamentos, desde a semana passada, foram dedicado à Michael Jackson. Sempre me achei mais estranho do que ele por viver num mundo em que as pessoas pareciam muito interessadas nele. Agora que ele morreu e o interesse aumentou, me sinto mais estranho ainda.
Michael Jackson é um bom cantor que fez bons discos até "Thriller" e depois nunca mais emplacou nada. Pronto. Não "criou o pop" nem "aproximou a música negra do rock branco", porque o rock É música negra tocada por garotos brancos que não quiseram ler partituras. Não dá para entender todo esse bafafá, por mais que lamentemos a morte, porque ele, para usar uma imagem poética, foi mais um satélite que irradiou a luz que vinha de outras fontes do que emitiu luz própria. "Thriller", o melhor disco, é exatamente isso. "Beat it" era um sucesso que procurava imitar a batida de "My Sherona", sucesso do qual ninguém mais se lembra. Seu solo de guitarra no estilo "martelada" já havia sido inventado por Eddie Van Halen há tempos - bastou apenas Quincy Jones sacar isso e botar o guitarrista para tocar na música. Os climas, ritmos que ouvimos e adoramos em "Thriller" já estavam em outros discos, de outros artistas, Jones e Jackson apenas souberam aproveitar, trabalhar em cima. O "Moonwalk" não foi inventado por ele, e isso nem chega a ser um demérito. Criar um passo tão infantil não é exatamente criar o cálculo infinitesimal, cuja paternidade deu tanta briga entre Leibniz e Isaac Newton.
Depois disso, a impressão que dava é que ele realmente passou a acreditar que era um Deus, tentou se distanciar da dança, das roupas, dos costumes e da sonoridade das ruas, da época, que ele refletia tão bem, e ficou chatíssimo. Michael Jackson já havia morrido antes, na década de 90. E virou "branco" antes mesmo de ser branco, se pensarmos que ele fez o que muitos artistas brancos americanos fizeram com artistas negros, como jazzistas e bluesmen - aproveitou o que havia na rua, adaptou, vendeu numa roupagem mais soft, e ganhou muito dinheiro com isso. Frank Sinatra, Tommy Dorsey, Gene Kelly, Fred Astaire, todos fizeram isso. Não chega a ser crime, acho eu. Mas é isso: ele refletiu, não lançou nada de novo. Não nos fez nos interessar por música indiana, não criou o heavy metal e foi funky ao mesmo tempo, não tentou elaborar novas formas de música pop, para citar algumas coisas que os Beatles, Jimi Hendrix, Led Zeppelin, The Who ou sei lá mais quem fizeram. Tentar achar em Michael Jackson ou sua companheira de época Madonna mais do que aquilo que eles aparentavam ser pode ser extremamente frustrante.

terça-feira, junho 16, 2009

as mentiras românticas que o cinema americano conta para os homens

a) a loura gostosa e sequiosa que você acha que vai estar te esperando no seu cafôfo no dia em que você leva um esporro do chefe, perde o distintivo - ou crachá - e ainda descobre que sua ex-mulher está dando para o seu pior inimigo. "I´m here, Sam... for you", diz ela para o herói, que ainda faz cu doce em vez de passar o rodo, por ser "muito macho", e não pode se entregar assim.
b) a ruivinha inocente que troca o principal astro esportivo da escola para ficar com o herói adolescente justamente porque ele é feio, desengonçado, tímido, sem sal, aparentemente meio brocha (aparentemente porque também é sabidamente virgem) e fala de coisas com ela não entende, como a história da guerra do Peloponeso ou o funcionamento de circuitos eletrônicos dos primeiros IBMs
c) a casadoira do início do século XIX que depois de se esbaldar nas valsas com sir Walsingham e nos jantares com o duque de Charlestornford, descobre que o homem certo para ela mesmo é o taciturno e carrancudo, porém justo e digno, major Neusbitt, cuja perna direita foi recentemente amputada após sua heróica participação na batalha de Trafalgar.
d) a rica piranhosa e dadeira que resolve se converter numa sensível moçoila ao ter seu coração tocado pelo motorista de táxi que pode ser um pobretão mal-arrumado mas mostra ter um interior muito sensível recitando Shakespeare nas corridas e falando de seu sonho de ser compositor.
e) a loura gostosa e sequiosa (olha ela aí de novo) que aborda você, puto, sem distintivo (ou crachá), com dor de corno, MAS no bar com balcãozão de madeira, onde, do outro lado, o barman avisando que essa é a última, "pal", enquanto toca algum Creedence ou Lynyrd Skynyrd - "rock de macho". Na verdade, o balcão de madeira é tão ilusório quanto a loura em si, é uma miragem que vem em jogo duplo, tal qual poltronas e sofás para a sua sala numa liquidação da Tok & Stock.
f) a indecisa que abandona o altar no dia de casamento para finalmente se render ao rude galã lanterneiro, com muito menos perspectivas na vida do que o operador da Bolsa sem sal que pode ser sem sal, mas faz tudo por ela, até trata o alcoolismo da sogra.

segunda-feira, abril 13, 2009

da oposição democrata-cristã cubana

Existe. Em Cuba mesmo. E eles divulgaram esta carta aberta abaixo:


PROYECTO DEMÓCRATA CUBANO
Miembro de la Organización Demócrata Cristiana de América (ODCA)

Sede: 7ma. # 49405 (altos), e/ 494 y 494-A. Playa de Guanabo, Municipio Habana del Este, Ciudad de La Habana, Cuba. C.P.: 19120
Teléfonos: (537) 642-9371 (537) 796-2636 (telefax). Emails: prodecu@gmail.com pdcuba@gmail.com. Sitio web: http://www.prodecu.org


San Cristóbal de La Habana, 13 de abril de 2009.

Excmo. Sr. Barack H. Obama
Presidente de los Estados Unidos de América
Casa Blanca, Washington D.C.

Excelencia:

A partir del triunfo alcanzado por usted al frente del Partido Demócrata en las elecciones del pasado mes de noviembre, la posibilidad de un cambio positivo en las relaciones entre los gobiernos de Cuba y los Estados Unidos comenzó a tomar forma en la mente y en los corazones de la mayoría de los cubanos.

Si en la historia pasada y reciente de la humanidad cincuenta años no se pierden con facilidad en el tiempo, nos preguntamos cómo lo percibirán los ciudadanos —tanto cubanos como norteamericanos— que, de alguna manera, han sufrido las consecuencias de estas cinco décadas de confrontación mayor y desencuentros entre nuestros dos países.

Nuestra organización opositora pacífica, el Proyecto Demócrata Cubano, en un documento que enviamos a las autoridades estadounidenses en 1996 planteamos: «Es un hecho que los actos políticos de los gobernantes de los Estados Unidos de América han influido y, a veces determinado, la historia del pueblo cubano a través de los tiempos». En esta nueva ocasión vuelven a tomar valor estas palabras.

Ahora no parece importante esclarecer si la crisis de los misiles en octubre de 1962 fue causa o consecuencia de la invasión de Bahía de Cochinos, sino como crear los escenarios más favorables para que el pueblo cubano avance en la recuperación de sus derechos y libertades. Y para lograr estos fines, en nuestra opinión, es vital la solución negociada del conflicto entre ambos gobiernos.

La Cumbre de Las Américas que se celebrará próximamente en Trinidad y Tobago parece ser el marco adecuado para comenzar a propiciar estas negociaciones. Conocemos de algunos avances en relación con el tema de las visitas a Cuba de cubanos residentes en los Estados Unidos y de las remesas que estos envían a sus familiares en las islas. Más hay, entre otros, dos asuntos de trascendental importancia: la inclusión de Cuba en todas las instituciones hemisféricas con todos sus derechos y deberes y el embargo o bloqueo que sufre el pueblo cubano desde hace ya casi cincuenta años por parte de Estados Unidos. En cuánto a lo primero parece tener una clara visibilidad el apoyo de la comunidad latinoamericana y caribeña a la restitución de Cuba. En cuanto al bloqueo, más allá de cualquier otra consideración, este viola los derechos humanos del pueblo cubano, victimiza a las autoridades cubanas y degrada la naturaleza social y política de quiénes lo aplican. Esto debe cesar.

Sabemos que remover añejos conceptos y prácticas no es una tarea fácil pero lo más importante es comenzar. Somos optimistas en cuánto creemos que las relaciones entre los pueblos y gobiernos de Cuba y los Estados Unidos tomarán el cauce de la normalización. Estamos seguros de que los opositores pacíficos independientes cubanos, que trabajamos por la libertad y la democracia en Cuba, en estas nuevas circunstancias, contaremos con el apoyo moral y político y la solidaridad del gobierno y el pueblo norteamericanos.

Le deseamos éxitos en sus empeños con la atestación de nuestro elevado respeto y consideración,






Rafael León Rodríguez
Coordinador General

sexta-feira, março 20, 2009

Elas sabem porque ela está apanhando. Sabem?

Uma das reportagens mais lidas no site do New York Times tem a ver com a agressão de Chris Brown a Rihanna. Mas não são detalhes do espancamento, antecedentes ou consequências: o jornal relata como, de uma maneira chocante para as velhas gerações, há um número substancial de adolescentes negras que apoiam Brown. Elas acham que se a cantora apanhou do namorado, alguma ela fez. E têm mais ciúme de Rihanna por estar com aquele gatinho espancador do que piedade e compreensão de que, se tal comportamento não é reprovado, cum pouco, são elas que entrarão na porrada. A reportagem segue mostrando como esta mentalidade que achávamos só possível nalguma senhora de engenho do século XVIII é um componente de um tipo de comportamento em que as adolescentes topam, submetem-se, aceitam a... a.... vamos lá, a superioridade masculina na relação. Elas aprendem que não devem denunciar agressões e abusos dos garotos, para não prejudicar-lhes o futuro - não é bonito isso, mulher sofrer calada em sacrifício?
Todo este recrudescimento moral, é claro, está apoiado no que um dos entrevistados chama de "a cultura do hip-hop", aquelas músicas MANEEEERAS em que toda mulher é puta e todo homem é medido pela quantidade de violência que está disposto a aplicar em seus semelhantes. De preferência, muito bem armado. O que é mais um indício de que o principal fenômeno comportamental, o mais generalizado, neste início de século, é o esvaziamento político da juventude: eles não representam mais a mudança, a experimentação. Representam o conservadorismo, e se orgulham muito disso, achando que um piercing no umbigo substitui uma ideia na cabeça.

quinta-feira, março 19, 2009

Eu e os bichos

O GANSO DO MEU PAI

No sítio do meu pai, havia gansos. Um foi roubado, outro foi atropelado, outro fugiu pelo córrego, outro morreu de doença e... assim foram minguando até sobrar um só. Que, minha mãe notou, ficava sempre incomodado, cabisbaixo, incerto, rodeando a casa, solitário.
Até que uma das galinhas do sítio ficou choca. O ganso, assim que viu o ninho que ela fez no lado do córrego, tomou para si a tarefa de guardá-lo, e à galinha: ficava sempre andando em volta dela, de guarda, expulsando até mesmo os galos e outras galinhas que chegavam perto.
Cheguei a duas conclusões observando os dois, na última visita que fiz ao sítio. Uma é que provavelmente está inscrito nos genes dos machos das espécies a tendência natural de proteger, cuidar de um ser que não seja você mesmo - o altruísmo é uma espécie de instinto masculino.
A outra conclusão, menos científica, é de que para deixa um ganso cabisbaixo mais animado, qualquer galinha serve.

O JACARÉ DA MINHA MÃE

O mesmo córrego por onde os gansos nadavam, certa vez, encheu com uma chuva e ligou-se a um pequeno açude que há no lado da casa do sítio dos meus pais. E com o transbordamento, veio um jacaré. Ele instalou-se no açude, e depois que as águas baixaram, decidiu ficar por lá por uns tempos.
Minha mãe começou a cuidar do jacaré. Atirava pedaços de pelanca que arrancava da carne que cozinhava, e de noite, gostava de procurar os olhos brilhantes dele com uma lanterna, de brincadeira.
Eu dizia para minha mãe que o jacaré, que ainda era um filhote, ainda iria crescer e comer ela, meu pai e os carneiros e galinhas que eles criavam, um a um.
Claro que minha mãe não me deu ouvidos - na nossa família, só ouvimos o que queremos ouvir.
Um dia, choveu de novo, o rio transbordou, atingiu o açude, o jacaré aproveitou e foi embora rio abaixo.
Nunca se afeiçoe demais a alguém que entrou na sua vida trazido por puro acaso. Eles também vão embora levados pelo puro acaso. Você fica.

A CALOPSITA DA MINHA AMIGA

Quando me separei, fui morar com uma amiga que tinha uma calopsita - uma espécie de periquito, só que com um topete de integrante do Sig Sig Sputnik (alguém se lembra?) e uma pelagem mais variada.
A calopsita me acordava de manhã com longos piados, demandando comida e atenção. Depois que soltávamos ela (ele, na verdade - o nome era Mané), o bicho gostava de ficar no meu ombro, bicando minha nuca. Às vezes, doía muito, mas às vezes, dava cócegas. Às vezes, ele cagava. Algumas camisas minhas ficaram estragadas, com o ombro esgarçado, de tanto lavar.
Ele era chato. Mas graças à ele entendi um pouco o que é ser mulher: é carregar no ombro alguém que cutuca as nossas partes mais sensíveis, e que não se importa de cagar em cima de você, de vez em quando.

A GATA DA MINHA HOME MATE

Minha amiga foi embora, e veio outra home mate. E alguns meses depois, veio um gato. Nas primeiras semanas, o gato ficava preso dentro do apartamento, que é térreo, e jamais deixávamos ele ir para uma área nos fundos, onde havia uma piscina, com medo de que ele caísse e morresse afogado.
Um dia, pedreiros foram para a área dos fundos montar um andaime para uma reforma do prédio. E o gato também foi. Eles disseram que eu poderia deixar o gato lá, que eles cuidariam dele.
Alguns minutos depois, o gato voltou para casa, molhado como um pincel embebido num tubo de tinta nanquim (ele é totalmente negro). Tinha caído na piscina. Minha home mate o secou. Mas não impedimos que ele voltasse a passear na área dos fundos por causa disso. Na verdade, foi bom ele ter caído na piscina e ter se safado sozinho; ele nunca mais fez isso de novo. O gato, constatei, é o ser vivo mais inteligente da casa onde moro. Ele só precisou cair uma vez para aprender a lição. Eu caio várias vezes nos mesmos buracos e até hoje não aprendi.

segunda-feira, março 09, 2009

Cousa de mulher

Lulu vê Deus e duvida, Gossip Girl, Chega de falar de mim: quando alguém com mais tempo e disposição do que eu vai fazer algum estudo a sério da literatura de mulherzinha do século XXI? É divertidíssima, e um comentário muito interessante sobre os costumes atuais - a partir do que as pessoas comem, bebem, compram, vestem, veem. Os anseios e angústias dos personagens, de ficção ou não, são comuns a nós mesmos e às pessoas com quem convivemos: desejo de integração ao grupo, dúvidas em relação ao futuro e aos próprios sonhos, indecisão sobre quem se é de verdade. Melhor do que ler historinha de dois homossexuais em cidade russa escrita por alguém que não sabe russo, não? Mulher, no geral, é um ser esquisito que junta as incombináveis características de ser extremamente realista por um lado, e por outro, ter esperança de concretizar sonhos românticos totalmente fora da realidade. Não se chega à felicidade com esta combinação. Mas esta tensão produz personagens interessantes, vívidos, que queremos acompanhar, torcer a favor ou contra, virar a próxima página.

quinta-feira, fevereiro 26, 2009

No dos outros é reciclado

O New York Times adota hoje um ângulo de visão insólito para debater os dilemas de um mundo que luta para manter seus padrões de bem-estar enquanto preocupa-se em guardar seus recursos naturais para as gerações futuras e preservar o meio ambiente: uma reportagem diz que os papéis higiênicos soft são um risco à preservação das florestas porque demandam árvores e mais árvores para serem feitos. Papel reciclado não funciona, dizem os fabricantes ouvidos na reportagem: a fibra dele não é tão macia. Você ralaria o cu num papel lixado para preservar os jatobás? Eis a questão última da ecologia.

Um velho refrão para uma nova era

Por falar em Obama, os seus pronunciamentos criticando os outros por problemas que agora cabe a ele resolver, seus anúncios estrondosos de medidas espetaculares e nunca seguidos de detalhamento de como ele atingirá estes objetivos e quanto isso vai custar, suas catilinárias cheias de preceitos morais que ninguém ousaria contestar, me fazem sentir muita falta de um outro negão que também tinha um belo dum refrão, melhor do que "Yes, we can": Cuba Gooding Jr. gritando "SHOW ME THE MONEY" para Tom Cruise em Jerry McGuire. Cadê o dinheiro, Obama????

Cuméquié?

Saiu no jornal hoje: a CIA vai informar diariamente o presidente dos EUA, Barack Obama, sobre os efeitos da crise econômica pelo mundo, indicando onde pode estar havendo turbulências políticas por causa da falta de dinheiro. Mas, espera um pouquinho... a) a CIA trabalha para a presidência da República, então, quede a notícia? b) não foram estes mesmos sujeitos da CIA que teriam cometido erros flagrantes procurando armas químicas inexistentes no Iraque, prendendo ilegalmente inocentes suspeitos de terrorismo, e mesmo não conseguindo prever os ataques de 11 de setembro? Então agora, de um mês para o outro, de repente eles todos viraram competentes inclusive para dar palpites sobre a crise econômica? Foi o poder taumaturgo de Obama, que cura todas as feridas e alivia todas as dores apenas com sua presença benfazeja, quem operou esse milagre?

quarta-feira, fevereiro 25, 2009

Antiguia dos botequins do Rio de Janeiro

Bip-Bip

A cerveja é quente. O banheiro é imundo. O dono do bar, inamistoso. Por que então esta mística em torno deste bar? Porque nele a esquerda da zona sul carioca mantém viva a chama de uma de suas principais bandeiras - a exclusão social. Se você é da patota, o Alfredo te trata bem. Se você é apenas um cliente comum, que quer beber uma cerveja em paz, é tratado como um cachorro sarnento. O Bip-Bip, no fundo, é apenas um microcosmo que explica porque o capitalismo venceu o socialismo: o capitalismo é mais igualitário. Gente de esquerda adora se sentir superior aos outros, mesmo que seja numa pocilga.

Bracarense

Também vigora lá a lógica da patota, mas o apartheid é mais brando do que o Bip-Bip. Se você for um cliente comum, a única restrição que sofre é não conseguir um banquinho a mais na calçada quando ela já estiver totalmente ocupada - e ver em seguida, na sua frente, alguém da patota conseguir este benefício. Mas no fundo, a única coisa da qual você é privado é da companhia de um bando de alcoólatras sem assunto ao seu redor.

Jobi

Nos fins de semana, é onde os publicitários paulistas se encontram para sentir o "charme do Rio de Janeiro", e por isso, fica recendendo a charme de publicitário paulista.

Lamas

É caro. Mas em compensação, também é quente. Cheque a conta duas vezes. Também cheio de bêbados chatos, como no Bracarense. Mas os que lá ficam parecem ter consciência de sua chatice e são um pouco mais deprimidos.

Bar do Adão

São apenas pastéis, e não especiarias indianas que conservem os alimentos num mundo medieval ainda sem geladeira. Ou seja, não vale a pena cruzar oceanos e continentes em busca deles, se você não mora no Grajaú.

Bar Lagoa

O mito de que seus garçons são mal-educados é mito. Eles são bem-educados. Mal-educados são os clientes. Apenas, de vez em quando (eu só vi uma vez), os garçons perdem as estribeiras com quem eles servem, integrantes da da comunidade mais mal-educada e arrogante do planeta - os cariocas de Ipanema. Mimados, sem noção, eternamente reclamando, histéricos, eles conseguem ser mais inoportunos do que os cariocas da Zona Norte e até mesmo os cariocas da Barra. A proximidade com a Faculdade da Cidade não melhora em nada o nível da clientela.


Mineiro

Se você conseguir entrar, conseguir sentar, conseguir ser atendido, conseguir que lhe tragam o pedido, conseguir pedir a conta, conseguir que lhe tragam a conta, conseguir pagar, conseguir o troco... bem, com este nível de perserverança e habilidades políticas, o que você está fazendo neste boteco de Santa Tereza, quando tantas vidas no Oriente Médio dependem de um bom negociador de um cessar-fogo?

sexta-feira, fevereiro 20, 2009

Fotos

O Círculo de Belas Artes de Madri expõe fotos de um tcheco, Josef Sudek, com registros sobre Praga nos anos 50. O comunismo havia acabado de chegar à força, depois de anos de dominação nazista. As fotos são tristes, chuvosas, tem uma surrealista, com uma taça com olhos dentro. O El Pais fez uma fotogaleria. O endereço é http://www.elpais.com/fotogaleria/Praga/desconocida/anos/6236-8/elpgal/

Velhos e novos

"É um povo que só quer saber de falar de videogame, não fala de mulher nem de dor de cotovelo. Nós, que somos assim, nos sentimos cada vez mais isolados", reclamou um amigo meu, mais velho, dos jovens nerds com quem ele trabalha - alguns dos quais são seus chefes.
Posso estar tomando uma experiência individual por geral, mas acho que estou assistindo a um fenômeno de desinteresse dos velhos pelos jovens que não se via, sei lá, desde a Revolução Francesa, movimento encabeçado primordialmente por jovens (se a minha memória não falha, o mais velho, Lafayette, tinha 30 anos na época da queda da Bastilha - Talleyrand, Mirabeau, Robespierre, Danton, todos tinham menos de 30 na hora em que brilharam).
Não é medo, nem ressentimento contra a juventude que já não temos. É desinteresse mesmo. Uma combinação incomum de esquerdismo na educação e excesso de televisão produziu uma geração singularmente desinteressada na realidade à sua volta e desinteressante nas suas idéias. O esquerdismo propagado em escolas de segundo grau e faculdades de ciências humanas, em vez de produzir massas de militantes do PSOL e do PSTU, que é o objetivo dos professores, fabricou apenas uma geração de desanimados intelectuais. Eles não têm respeito por nenhuma idéia ou valor, porque lhes foi ensinado que nenhuma idéia é digna de ser confiável, ou de que nenhum valor é superior a outro. Tudo deve ser questionado, tudo deve ser aceito. Quando não podemos acreditar em nada, e não podemos recusar nada, pouco interesse há para que façamos escolhas e reflexões que determinem o caminho que tomaremos na vida - tanto faz.
Ao lado deste esvaziamento intelectual, a televisão treinou esta geração, com mais intensidade do que treinou as anteriores, a não esperar e a gostar dos prazeres imediatos e sem esforço. Também lhes adestrou para ficarem conectados a uma vida mais brilhante, prazeirosa, divertida e agitada, nas novelas e séries e realities shows, que estão a uma distância suficientemente segura para evitar as dores e decepções de uma vida vivida na realidade.
Com tal massacre, o que temos são jovens que repelem qualquer aproximação com a realidade difícil e insatisfatória do mundo político, dos problemas econômicos, das obras de arte que exigem reflexão e boa vontade para serem entendidas. E voltam-se para as diversões de prazer imediato e frágil, como a televisão e os videos engraçadinhos do Youtube e os funks de letra e melodia primárias, fáceis de serem entendidas. O problema é que estes prazeres não se sustentam por muito tempo; logo acabam, deixando quem se beneficia deles com uma sensação de vazio que tem de ser preenchida por... uma nova série, um novo vídeo idiota do youtube, um novo proibidão.

Epa

Deu no New York Times de hoje: o Irã tem mais urânio enriquecido do que se pensava, suficiente para construir uma bomba atômica. http://www.nytimes.com/2009/02/20/world/middleeast/20nuke.html?_r=1&hp

quarta-feira, fevereiro 11, 2009

Imitação da vida

Mercado de artes é como qualquer mercado, ou uma imitação do mercado financeiro. Os investidores estão fazendo, na primeira década deste século, o movimento que os dealers e traders fizeram na última década do século passado: apostando em ativos de emergentes, que podem ter uma grande rentabilidade sobre um preço baratinho. Primeiro foi a China. Agora, artistas indianos são convidados para o Arco de Madri, pelo que li na Folha de S. Paulo. Vi uma expo de arte contemporânea chinesa no ano passado. Fraquíssima. Imitação do que se faziam em Nova York e Berlim nos anos 80, mas com todo mundo de olho puxado. Agora, pelo que vi na reportagem da "Folha de S. Paulo" sobre o Arco, temos um artista indiano que exibe duas figuras hindus, lado a lado, divididas por uma imagem de caveira esparramada no chão - sim, sim, é uma "referência" à aquele quadro do Hans Holbein, "Os embaixadores". O editor da Ilustrada não sacou, parece, pois não fez referência ao Holbein. Mas funciona assim: galeristas e colecionadores compram, depois repassam para arrivistas sociais cheio de grana querendo reconhecimento dos sofisticados, e daqui a vinte anos, estas obras vão estar em mostras organizadas mais para mostrar o "espírito da época", o "zeitgeist", os hábitos de consumo, do que para mostrar arte mesmo.

Tem que dar certo

Ele apareceu bonitão na praia, apareceu bonitão ao lado de veteranos de guerra, apareceu bonitão ensinando crianças, foi eleito com um bordão sintético, vibrante e simplificador, usa ternos de bom corte, a roupa certa, a entonação apropriada, as associações históricas pertinentes. E acaba de anunciar um plano econômico que ninguém entendeu direito. Dá para entender porque eu só chamo o novo presidente dos EUA de Obama Collor de Mello?

terça-feira, fevereiro 10, 2009

Vai piorar

O aviso é Jon Entine em artigo da Reason Online, revista eletrônica norte-americana que não tem medo de ser desagradável: a crise das hipotecas não vai ser nada quando os fundos de pensão começarem a quebrar em 2009. Vão quebrar, segundo ele, porque a partir do fim dos anos 1980, os fundos de pensão norte-americanos, em nome da "responsabilidade social", deixaram de investir seu dinheiro em certos empreendimentos considerados danosos, como armas, tabaco e álcool, mas que vão muito bem, obrigado, para dedicarem-se a incentivar negócios "socialmente responsáveis". O problema é que estes negócios socialmente responsáveis não deram lucro, ou deram menos do que o necessário para garantir as pensões dos trabalhadores que contribuíram para estes fundos. O resultado: alguém vai pagar a conta por essa responsabilidade social toda. Todos nós. Para saber mais... http://reason.com/news/show/130843

quinta-feira, fevereiro 05, 2009

Perdi a curiosidade

A curiosa história de Benjamin Button conta a vida de um homem que nasce velho e vai ficando jovem à medida que envelhece. Interessante. Curioso. E saí antes de o filme chegar à metade. Depois que é apresentada a aberração, o pouco que vi foi uma versão de Forrest Gump sem a ironia, só com a bonita mensagem de que todas as pessoas devem ser respeitadas e que a vida é bela. A vida é bela, saí do filme para aproveitá-la, em vez de ficar mais uma hora e meia sendo irritado no escuro por pessoas que nasceram incapacitadas de desligar os celulares em salas de cinema.

quarta-feira, fevereiro 04, 2009

Dako é bão

Quando soube disso, de primeira, achei uma avacalhação: o artista plástico espanhol Santiago Serra bolou um vídeo chamado "Los Penetrados", em que, filmando e fotografando grupos de pessoas negras e brancas praticando sexo anal, ele buscou fazer uma reflexão sobre racismo e política de imigração. Os participantes receberam 250 euros cada um para serem sodomizados.
Coisas que pensei no início; a) conheço algumas pessoas que pagariam 250 euros para participar desta instalação artística; b) durante anos, na minha infância, morei perto de um cinema pornô tétrico, e nunca vi ninguém sair de uma sessão coçando a cabeça e pedindo novas políticas migratórias ou falando da importância de Martin Luther King e da política de cotas.
Bem, mas aí eu fui no site de Santiago Serra - para ver putaria, não para pensar em imigração, é claro. Mas... não é que a pornografia dele FAZ você pensar nisso? Pelo menos me fez pensar, porque afinal de contas, é um vídeo de um artista espanhol, de um país que está bem perto da África e tem de lidar com os imigrantes africanos ilegais que chegam fugidos da pobreza do continente vizinho. E faz pensar também nos estereótipos sexuais que associamos à cor da pele das pessoas, que também é uma forma de racismo, e de um dos principais temores que havia - ainda há - entre os defensores da separação de pessoas pela cor da pele: sexo interracial. Moral da história: TUDO pode nos fazer pensar. Basta termos capacidade de reflexão e nos deixarmos levar pela argumentação do nosso interlocutor - no caso, Sierra e sua obra. Não à toa, "A República", o livro de filosofia que erigiu a nossa civilização e nossos costumes, ao lado da "Bíblia", começa com uma conversa sobre o que é ser um velho brocha. Quem quiser conferir a instalação de Sierra, pode clicar no título deste post ou ir para http://www.santiago-sierra.com/200807_1024.php

terça-feira, fevereiro 03, 2009

Vim, vi e perdi meu tempo

Se tivesse a duração normal, de uma hora e meia, Austrália seria apenas o pior filme do Baz Luhrman. Como a sessão, incluindo trailers etc, tem ao todo três horas, é provavelmente o pior filme do ano. Luhrman tentou falar de cultura aborígene, importância da cultura oral, faroeste, romance, segunda guerra mundial (é o único western com avião japonês fazendo de Austrália uma Pearl Harbor jamais registrada na história do cinema) e se esqueceu de contar uma história. E nem dá para entender quando e porque os protagonistas se apaixonam.

quarta-feira, janeiro 28, 2009

Darwin e a involução

Quero que Barack Obama não tire as tropas do Iraque, não feche a prisão de Guantánamo e restrinja o etanol brasileiro, se eu estiver mentindo (na verdade, ele vai fazer isso, mas não é o momento para falar disso). Mas essa história é real.
Um amigo meu tinha de apresentar um relatório numa reunião de uma grande empresa. Sabe como é, um daqueles "papers" com power point etc. O tema tinha a ver com a evolução dos produtos da sua companhia. Ele pensou num jeito de apresentar um trabalho bonitinho, com uma, ahn, "mensagem"
E tascou, na apresentação do trabalho, alguma frase que, se não me engano, era... "A evolução nos torna melhores". Algo deste nível. Para dar um verniz de profundidade a esta frase, ele tinha de dar um autor para ela, certo? Qual seria o autor apropriado, pensou ele (é, ele ainda PENSOU)? Charles Darwin, é claro.
A apresentação do trabalho foi um sucesso e ele ainda foi cumprimentado pelo chefe por ter buscado nas raízes do pensamento de Darwin uma frase que resumia tão bem os desafios e a missão da empresa. Tal é o mundo mental dos executivos e de gente que faz MBA.

Coelho morre

Vamos falar um pouco do que não tenho certeza: talvez John Updike tenha sido, para o mundo industrial, algo similar ao que foi Dante Aligheri para a Idade Média: o escritor que fixou para a história um modo de vida e de pensar que ele sabia que estava acabando, mudando. As histórias da série "Coelho", e os contos e outros livros sobre o comportamento da classe média dos subúrbios, registraram a mudança de hábitos sexuais e comportamentais a partir do fim dos anos 50 que se espalhou por uma vasta maioria antes ajustada em seus papéis - vai lá, o que os chatos chamam de "burguesia" - e o desconforto do Macho Branco Adulto em não ser mais o centro do mundo. Se você é um Macho Branco Adulto, acha comovente. E consolador. E até gosta mais deste novo mundo.

sexta-feira, janeiro 23, 2009

Vi, e... continuo achando desinteressante

Instado por uma amiga, assisti a alguns dos... melhores momentos? do Big Brother. O que pensar disso? Foi engraçado, ver aquele bando de gente se comportando como adolescente. Talvez este seja o segredo do sucesso da coisa toda, acompanhar as aventuras de uma turma de gente que não quer crescer numa Terra do Nunca em forma de casa cenográfica. Foi bom olhar as bundas e peitos das vagabas que lá estão fazendo lap dance, numa festa na terça-feira. Mas realmente não me pega. Aquelas pessoas são todas desinteressantes, é o tipo de gente do qual eu passo meus dias fugindo, não vou deixá-los entrar aqui em casa.
De mais a mais, resta a constatação de que talvez não haja nenhum escritor do século XX que tenha tido um fim tão amargo quanto George Orwell, mesmo, ou principalmente, depois de morto. Seu "1984" foi criado como um alerta para o perigo de um futuro totalitarista em todo o mundo, uma denúncia contra Stalin, que quase o matou na Guerra Civil Espanhola, que não foi entendido e foi perseguido na época - cadê o grande livro da máquina de propaganda dos comunistas, heim? Agora, a melhor criação do livro, o "Grande Irmão", o alerta contra a falsidade e a distorção do sentido da linguagem pelo totalitarismo, teve seu sentido distorcido para tornar-se um show de "realidade de mentirinha" - que era, no fundo, algo contra o qual ele também lutava. É como se estivessem violando o cadáver.

Não vi, mas já gostei

Ainda não vi Austrália, novo filme de Baz Luhrmann. Só li as críticas. Mas acho que provavelmente gostarei do filme. Porque as críticas, no geral, dizem que ele está apenas copiando "... E o vento levou" e outros épicos hollywoodianos d'outrora. Bom, ele nunca escondeu que se baseava em velhos filmes e outros produtos pop para fazer os seus. Luhrmann é bom e popular entre os jovens por causa disso: nos filmes que faz, ele consegue pegar a cultura pop, de consumo rápido, fácil de se fazer, de se distribuir, e retirar dela um sentido mais profundo, que explica como músicas ligeiras feitas para ser digeridas sem muita atenção, como "Time after time" e "Your song", nos afetam, nos dizem coisas sobre nossas experiências, o que explica como e porque elas ainda tocam em programas de rádio na madrugada. O pessoal da Escola de Frankfurt iria vomitar, mas afinal de contas, quem leva mesmo a sério Adorno e Benjamin, a não ser se for para conseguir aquela sonhada bolsa de Pós-Mestrado sanduíche que lhe permita estudar metade de um ano no Exterior ou ficar mais alguns anos fazendo doutorado sem ter de se preocupar em procurar um emprego digno do nome? Na vida prática, real, ninguém presta atenção.
Luhrmann falou das principais preocupações da juventude nos seus três primeiros filmes, de forma alegórica: o medo de ter a vida dirigida pelos outros em "Dança Comigo", o medo da violência sem sentido causada por excesso de hormônios em "Romeu e Julieta", que transformou Verona num cemitério (a primeira imagem da cidade é de um Cristo Redentor, mas com um aspecto de escultura de jazigo), interpretando o ímpeto suicida dos protagonistas como um desejo de voltar ao útero (a primeira vez que eles se vêem é através da água de um aquário; a primeira vez que se beijam, dentro de uma piscina), e a repulsa ao papel de prostituta de luxo que é dado às jovens na sociedade de consumo, em "Moulin Rouge". Do que ele está falando em "Austrália", não sei. Mas é uma história de travessia e uma história de um homem que gosta de uma mulher (afeição não muito popular e compreendida entre críticos, aliás; a maioria prefere homens que gostam de homens, homens que gostam de histórias em quadrinhos e bonecos de Obi-Wan Kenobi em tamanho natural, mulheres que gostam de se suicidar, mulheres que gostam de matar homens, mas mulher e homem junto, xô, sai, Satanás, é pecado). Talvez ele tenha sacado que os jovens estejam não voltando a padrões conservadores de comportamento, mas em busca de valores sólidos, estáveis, que valham para toda uma vida, não para um verão. Estes valores podem ser catolicismo, budismo, filosofia grega, igreja pentecostal. Mas a verdade é que o domínio do relativismo moral acabou, não importa o que as beatas e fanáticos deste credo berrem, nas universidades, galerias de arte ou artigos de cadernos literários. Indo em busca do certo ou do errado, a verdade é que os jovens querem algo que ultrapasse a própria juventude, e "Austrália" pode estar falando disso.

Efemérides

No ano passado, fomos todos atormentados, chamados a participar, admirar, torcer, ler suplementos especiais, sobre os 40 anos de 1968. Curiosamente, não estou vendo esse frisson todo pelos 20 anos de 1989. Os movimentos políticos de 1968 na França, Tchecoslováquia e Brasil fracassaram. A mudança de comportamento e cultura proposta naquele ano, de "liberação", basicamente, confirmou aquela maldição que Allan Bloom pregou em seu livro "O declínio do mundo ocidental": adolescentes criados na crença de que todos os valores são iguais tornam-se apenas jovens e adultos sem valores, o que significa sem saber sua posição no mundo, sem ânimo para fazer da sua vida algo significativo. Vemos isso todos os dias. Já 1989, bem, em 1989, acabou o comunismo na Europa. Embora leiamos de quando em quando artigos de jornal dizendo que há saudades da "segurança" do comunismo, em jornais brasileiros, não há. Acabou mesmo. O fim do comunismo também foi o fim de um debate intelectual que dominou o século XX basicamente calcado em mentiras, sobre a superioridade moral ou intelectual do socialismo em relação ao hipócrita e conspurcado sistema liberal ocidental. Em 1989, ficou mais do que claro o alcoolismo, a prostituição, a fome, a devastação ambiental (todo um mar interior foi secado por um projeto de irrigação errado na Rússia) causados pelo socialismo. Essa revolução não chegou ainda a lugares mais distantes e obscuros, como departamentos de ciências humanas e sociais de universidades brasileiras. Mas significou a liberdade política para milhões de pessoas da Alemanha à Sibéria, e a liberdade intelectual para outros milhões de pessoas do lado ocidental, que não precisavam mais sentir culpa em dizer que gostavam de ter bens só seus, de consumir, sem se interessar por estilos alternativos de organização política. Então, cadê as comemorações?

terça-feira, janeiro 20, 2009

o princípio da realidade

Começou hoje o processo de revisão histórica dos dois governos de George W. Bush.