Total de visualizações de página

sexta-feira, janeiro 23, 2009

Vi, e... continuo achando desinteressante

Instado por uma amiga, assisti a alguns dos... melhores momentos? do Big Brother. O que pensar disso? Foi engraçado, ver aquele bando de gente se comportando como adolescente. Talvez este seja o segredo do sucesso da coisa toda, acompanhar as aventuras de uma turma de gente que não quer crescer numa Terra do Nunca em forma de casa cenográfica. Foi bom olhar as bundas e peitos das vagabas que lá estão fazendo lap dance, numa festa na terça-feira. Mas realmente não me pega. Aquelas pessoas são todas desinteressantes, é o tipo de gente do qual eu passo meus dias fugindo, não vou deixá-los entrar aqui em casa.
De mais a mais, resta a constatação de que talvez não haja nenhum escritor do século XX que tenha tido um fim tão amargo quanto George Orwell, mesmo, ou principalmente, depois de morto. Seu "1984" foi criado como um alerta para o perigo de um futuro totalitarista em todo o mundo, uma denúncia contra Stalin, que quase o matou na Guerra Civil Espanhola, que não foi entendido e foi perseguido na época - cadê o grande livro da máquina de propaganda dos comunistas, heim? Agora, a melhor criação do livro, o "Grande Irmão", o alerta contra a falsidade e a distorção do sentido da linguagem pelo totalitarismo, teve seu sentido distorcido para tornar-se um show de "realidade de mentirinha" - que era, no fundo, algo contra o qual ele também lutava. É como se estivessem violando o cadáver.

Não vi, mas já gostei

Ainda não vi Austrália, novo filme de Baz Luhrmann. Só li as críticas. Mas acho que provavelmente gostarei do filme. Porque as críticas, no geral, dizem que ele está apenas copiando "... E o vento levou" e outros épicos hollywoodianos d'outrora. Bom, ele nunca escondeu que se baseava em velhos filmes e outros produtos pop para fazer os seus. Luhrmann é bom e popular entre os jovens por causa disso: nos filmes que faz, ele consegue pegar a cultura pop, de consumo rápido, fácil de se fazer, de se distribuir, e retirar dela um sentido mais profundo, que explica como músicas ligeiras feitas para ser digeridas sem muita atenção, como "Time after time" e "Your song", nos afetam, nos dizem coisas sobre nossas experiências, o que explica como e porque elas ainda tocam em programas de rádio na madrugada. O pessoal da Escola de Frankfurt iria vomitar, mas afinal de contas, quem leva mesmo a sério Adorno e Benjamin, a não ser se for para conseguir aquela sonhada bolsa de Pós-Mestrado sanduíche que lhe permita estudar metade de um ano no Exterior ou ficar mais alguns anos fazendo doutorado sem ter de se preocupar em procurar um emprego digno do nome? Na vida prática, real, ninguém presta atenção.
Luhrmann falou das principais preocupações da juventude nos seus três primeiros filmes, de forma alegórica: o medo de ter a vida dirigida pelos outros em "Dança Comigo", o medo da violência sem sentido causada por excesso de hormônios em "Romeu e Julieta", que transformou Verona num cemitério (a primeira imagem da cidade é de um Cristo Redentor, mas com um aspecto de escultura de jazigo), interpretando o ímpeto suicida dos protagonistas como um desejo de voltar ao útero (a primeira vez que eles se vêem é através da água de um aquário; a primeira vez que se beijam, dentro de uma piscina), e a repulsa ao papel de prostituta de luxo que é dado às jovens na sociedade de consumo, em "Moulin Rouge". Do que ele está falando em "Austrália", não sei. Mas é uma história de travessia e uma história de um homem que gosta de uma mulher (afeição não muito popular e compreendida entre críticos, aliás; a maioria prefere homens que gostam de homens, homens que gostam de histórias em quadrinhos e bonecos de Obi-Wan Kenobi em tamanho natural, mulheres que gostam de se suicidar, mulheres que gostam de matar homens, mas mulher e homem junto, xô, sai, Satanás, é pecado). Talvez ele tenha sacado que os jovens estejam não voltando a padrões conservadores de comportamento, mas em busca de valores sólidos, estáveis, que valham para toda uma vida, não para um verão. Estes valores podem ser catolicismo, budismo, filosofia grega, igreja pentecostal. Mas a verdade é que o domínio do relativismo moral acabou, não importa o que as beatas e fanáticos deste credo berrem, nas universidades, galerias de arte ou artigos de cadernos literários. Indo em busca do certo ou do errado, a verdade é que os jovens querem algo que ultrapasse a própria juventude, e "Austrália" pode estar falando disso.

Efemérides

No ano passado, fomos todos atormentados, chamados a participar, admirar, torcer, ler suplementos especiais, sobre os 40 anos de 1968. Curiosamente, não estou vendo esse frisson todo pelos 20 anos de 1989. Os movimentos políticos de 1968 na França, Tchecoslováquia e Brasil fracassaram. A mudança de comportamento e cultura proposta naquele ano, de "liberação", basicamente, confirmou aquela maldição que Allan Bloom pregou em seu livro "O declínio do mundo ocidental": adolescentes criados na crença de que todos os valores são iguais tornam-se apenas jovens e adultos sem valores, o que significa sem saber sua posição no mundo, sem ânimo para fazer da sua vida algo significativo. Vemos isso todos os dias. Já 1989, bem, em 1989, acabou o comunismo na Europa. Embora leiamos de quando em quando artigos de jornal dizendo que há saudades da "segurança" do comunismo, em jornais brasileiros, não há. Acabou mesmo. O fim do comunismo também foi o fim de um debate intelectual que dominou o século XX basicamente calcado em mentiras, sobre a superioridade moral ou intelectual do socialismo em relação ao hipócrita e conspurcado sistema liberal ocidental. Em 1989, ficou mais do que claro o alcoolismo, a prostituição, a fome, a devastação ambiental (todo um mar interior foi secado por um projeto de irrigação errado na Rússia) causados pelo socialismo. Essa revolução não chegou ainda a lugares mais distantes e obscuros, como departamentos de ciências humanas e sociais de universidades brasileiras. Mas significou a liberdade política para milhões de pessoas da Alemanha à Sibéria, e a liberdade intelectual para outros milhões de pessoas do lado ocidental, que não precisavam mais sentir culpa em dizer que gostavam de ter bens só seus, de consumir, sem se interessar por estilos alternativos de organização política. Então, cadê as comemorações?