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terça-feira, outubro 25, 2005

"Até parece que no Brasil todo mundo atira em todo mundo", queixou-se um amigo meu ao ler um lead de uma reportagem do New York Times sobre o referendo na semana passada. Não disse nada; só pensei em Walter Lippmann e seu livro sobre opinião pública que tem este mesmo nome, "Opinião Pública". Lippmann, acho, tinha menos de 30 anos quando escreveu este livro. Ele depois veio a ser o mais influente colunista político americano, amigo de Raymond Aron, um dos primeiros a dizer que o envolvimento no Vietnão ia dar errado. Seu livro tornou-se um clássico da comunicação social - mas ainda não foi traduzido para o portugês, o que diz muito sobre a, digamos, capacidade de "debate de idéias" no "espaço público universitário", para usar jargões de professor de filosofia da USP. Talvez porque em outro livro, anterior, ele mostrou como as esperanças dos jornalistas americanos despertados com a Revolução Russa acabaram por turvar o noticiário sobre a tomada do poder por Lênin.
O que tem a ver um livro da década de 20 com uma abertura de notícia de jornal da semana passada? É que nele Lippmann dedica uns três capítulos a explicar a importância dos estereótipos para as nossas visões de mundo. Os estereótipos dão uma ordem de importância às informações que colhemos da realidade externa, eles simplificam e tornam mais fáceis de entender o que vivemos. Especialmente no caso de termos de entender algo que acontece a quilômetros de nós, como no caso dos leitores novaiorquinos e o referendo no Brasil sobre as armas. O que é preciso, segundo Lippmann, é saber isso, ter consciência de que os estereótipos nos mostram uma parte da realidade, não a verdade inteira. Ou seja, dizer que fulano é "classe média" diz muito sobre ele, mas não diz tudo. O que quer dizer que quando o sujeito do New York Times escreveu que os brasileiros costumam atirar uns nos outros ou coisa parecida, ele estava apenas tentando resumir em uma frase forte, para que novaiorquinos compreendessem de uma maneira simples, um problema que salta aos olhos de um estrangeiro: que no Brasil a violência é grande. É um detalhe a ser ressaltado, mas não é toda a verdade. Da mesma maneira que quando lemos nos nossos jornais e revistas sobre o "consumismo americano", não quer dizer que o país com mais orquestras sinfônicas e universidades do mundo seja habitado apenas por gente que come McDonald's e freqüenta shoppings o tempo inteiro.
E por falar em referendo, uma frase de Lippmann pode explicar porque muita gente votou no Não mesmo sendo a favor da paz, do desarmamento: é que elas têm de viver em um mundo mais complexo do que gostariam de viver. E devem ter se ressentido de pregações morais a favor do Sim que ignoraram estas complexidades. OU, segundo as palavras de Lippmann: "A preparação dos caracteres para todas as situações em que os homens talvez enfrentem é uma função da educação moral. Calaramente então, depende, para seu sucesso, da sinceridade e conhecimento no qual o ambiente externo foi explorado. Porque em um mundo falsamente concebido, nossos próprios caracteres são falsamente concebidos, e nós caímos em um engano. Desta forma, o moralista deve escolher: ou ele oferece um padrão de conduta para todas as fases da vida, não importa o quão desgostosas algumas delas possam ser, ou ele deve garantir aos seus pupilos que eles nunca serão confrontados pela situação que ele desaprova. Ou ele consegue abolir a guerra, ou ensina às pessoas como suportá-la com a maior economia psicológica possível; ou ele abole a vida econômica do homem e o alimenta com poeira e orvalho, ou ele deve investigar todas as perplexidades da vida econômica e oferecer padrões de conduta que são aplicáveis em um mundo onde nenhum homem consegue se sustentar sozinho. Mas isso é justamente o que a cultura moral predominante costuma recusar-se a fazer. Nos seus melhores aspectos é uma atitude hesitante sobre as complicações do mundo moderno. Nos seus piores, é apenas covarde".
O livro dele pode ser lido na Internet nos endereços:
http://xroads.virginia.edu/~HYPER2/Lippman/pbpnn10.txt
http://www.gutenberg.org/etext/6456

Um comentário:

Taroíra disse...

Carái, Gugu, vi uma coisa que nunca tinha visto na internet... SPAMMERS DE COMENTÁRIOS DE BLOG!!!!!

Putaquiupariu!!!!