"O grande líder se foi nos braços de suas companheiras e rodeado por sua guarda pessoal e de todas as unidades que cuidavam de sua segurança, depois de um breve período de doença". Foi assim que as Farc confirmaram a morte de Tirofijo, Manuel Marulanda, seu líder supremo e fundados. E o que eu pensei quando li o comunicado no jornal foi: o problema da América Latina não é o capitalismo, o imperialismo, a má distribuição de renda, a proximidade com os Estados Unidos. É o sentimentalismo na hora de escrever.
Tudo no comunicado cheira a romantismo de anotação de adolescente do interior do Espírito Santo no dia posterior ao seu primeiro beijo, na festa do Tomate e da Uva no Galpão Municipal. Nada é chamado pelo nome certo. Tudo tem um adorno, um floreio, um exagero. Em vez de "líder", é o "GRANDE líder", afinal de contas, ele não era um líder qualquer - como se houvesse, aliás, líderes "quaisquer", gente banal com capacidade de liderança (o fato de o sujeito ser um assassino inútil não vem ao caso). E ele não se foi desesperançado, sozinho, se cagando, mijando e tossindo, como as pessoas normais morrem não. Foi-se "nos braços de suas companheiras e roedado por sua guarda pessoal e de TODAS as unidades que cuidavam da sua segurança, após um BREVE período de doença". Afinal de contas, se o cara é um grande líder, tem de ser um grande comedor também, porque sabe como é, como latino é ruim de cama, tem de dizer a toda hora que é o contrário, para tentar se convencer disso, e aos outros. Por isso o verso de bolero "nos braços de suas companheiras". É isso aê, mermão, tou morrendo mas tô pegando. Na verdade, as Farc pegam mulheres à força para estuprá-las continuamente, e se companheiras havia ao lado do lamentável moribundo, deviam ser prisioneiras forçadas. E ele também estava ao lado de sua "guarda pessoal", como se fosse um imperador romano, um sátrapa, e "de todas as suas unidades". Toda essa fantasia de Clóvis Bornay em estilo de press-release é para dizer que o sujeito morreu escondido num acampamento. E após um período dee "breve doença". Só falta dizer que ascendeu aos céus que nem a Virgem Maria.
Mas, enfim, foi-se, vai queimar num buraco bem fundo do inferno. O problema é que morre o homem, mas fica o estilo. E essa incapacidade de querermos chamar a coisa pelo nome certo, de olharmos com racionalidade e calma para a nossa realidade, nos fode mais do que as Farc com as adolescentes pobres que eles raptam na base do fuzil.
segunda-feira, maio 26, 2008
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